Friday 18 September 2009

O templo, o demónio e a menina


É sabido que o Japão esta coberto de tempos. As religiões predominantes aqui: xintoísta e budista assim o ditam. Deste modo, não é difícil talvez exagerando um bocadinho, encontrar um templo novo em cada meia dúzia de quilómetros. Este, de onde volto, está a oito quilómetros de Tenri e é lindíssimo.


Construído à volta dos campos onde, em tempos idos, se encontrou o primeiro templo do Japão tem tudo aquilo que o nosso imaginário espera encontrar de um templo. Em seu redor florestas do que serão sakuras e bambus altos como todos os bambus devem ser. Todos os sinais e avisos estão cobertos por telhados triangulares tradicionalmente trabalhados. As luzes, que quando a noite espreita e fica iluminam o caminho até ao primeiro edifício onde o altar de kami-sama está, estão escondidas em casinhas, como se fossem pirilampos num mundo pequenino e transparente. O templo em si, e os vários edifícios que o compõem, é de madeira trabalhada, cheia de pormenores e adereços em papel, ferro ou ouro. As oferendas e pedidos ondulam no vento presos ao templo e aos seus deuses pelo papel ou a madeira em que estão esculpidos. Os caminhos cobertos de pedrinhas brancas que, segundo tradições antigas representam a água que purifica o corpo e a mente. E as árvores individuais estão, como já é habitual aqui, trabalhadas com um carinho que se vê. Por fim, o altar (ou os altares, pois há vários: um para cada deus) é decorado e despretensioso, solene e humilde, simples e rico, num jogo perfeito, impossível no ocidente, onde se junta franqueza, humanismo, esoterismo e religião.

Subindo os caminhos dignos de delírios oníricos temos a paisagem avassaladora do céu, com o seu sol escondido atrás de nuvens brancas, da montanha que suavemente nos abraça e da cidade, vila e aldeia que se estende com ambiguidade entre os campos de arroz e as montanhas no horizonte.



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Na foto, lá está ele: jeans, camisola azul clara, de frente do altar principal, num gesto que, pela fotografia, poderia parecer uma bênção. Esse homem, durante os longos minutos de visita a essa clareira do templo e mais, esteve nesse local mexendo-se desconfortavelmente, andando um bocadinho para a frente e recuando logo de seguida, mexendo os braços lentamente em direcção à cara e ao tronco, controlados mas incoerentes nos seus movimentos. Dir-se-ia estar a debater com ele mesmo se se aproximava do templo à sua frente ou se fugia do mesmo o mais depressa possível. Há quem diga que as drogas poderiam dar-lhe momentaneamente esse comportamento invulgar, eu quero e prefiro pensar que é apenas uma alma atormentada pela vida e, talvez, por um passado maldito a tentar decidir se merece ser liberto da sua condição de condenado a ele mesmo.



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Como sei muito bem, graças à quantidade relativamente avantajada de irmãos e irmãs que tenho, as crianças, com a curiosidade à flor da pele e as inibições sociais ainda por desenvolver podem ser, por vezes, quando confrontadas com situações novas ou inesperadas, podem ser uma mistura de chatas e engraçadas mediante o nosso estado de espírito de momento. Se, para nós que vimos de longe, ver uma /Elegant Gothic Lolita, é suficiente para queremos tirar uma foto, para uma menina japonesa com uns seis ou sete anos, ver alguém alto, totalmente vestido de preto e cabelos compridos é o suficiente para fazer o mesmo. E isso, nos maravilhosos tempos de hoje em dia, torna-se possível com o uso de telemóveis. Foi uma menina dessas que me acompanhou durante algum tempo durante a minha viagem pelo templo, tirando fotos a toda a oportunidade e fugindo assim que se sentia observada. Aquando do meu isolamento lá me perguntou, traquinas e curiosa, se a minha pessoa era rapaz ou rapariga. Eu lá lhe expliquei, num japonês com o maior nível de macarrónice existente, que era rapaz e que, de onde eu vinha, há rapazes que têm nagai kami (cabelo comprido).


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Um dos deuses que tinha um altar, em tons de vermelho e branco, com guizos gigantes como enfeites, neste templo, é o deus do estudo. Esse, era atingível subindo, com algum esforço que servia de metáfora para o próprio estudo, umas escadas de madeira e pedra ladeadas por uma floresta de bambus. Eu, como é não-tão-óbvio, dei-lhe uma moeda e, fazendo o simples ritual de fechar os olhos de mãos juntas em prece, bate-las duas vezes e pedir um desejo: que me safa bem no ano escolar que se adivinha.



1 comment:

  1. hey!! falo com o pai quase todos os dias! ele disse me que nao te consegue ligar pq diz que o numero nao esta disponivel! manda lhe um mail cm o teu numero..

    e quero ir ai!!

    parece ser lindo =)

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